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O Período Neo-Babilônico e a Destruição de Jerusalém – Parte 1
(Por Carlos M. Silva)
Fonte: Mentes Bereanas

Antes de iniciar essa consideração uma ressalva se faz necessária. A Bíblia não fornece datas. Todas as datas vinculadas a eventos bíblicos se baseiam em descobertas da Arqueologia. Se a Bíblia não dispõe de tais informações, significa que elas não são necessárias para o verdadeiro Cristianismo, pois nela se encontra a seguinte afirmação: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e proveitosa.... a fim de que o homem de Deus seja plenamente competente, completamente equipado para toda boa obra.” (2 Timóteo 3:16, 17). Se a Bíblia dependesse de fontes pagãs para suprir necessidades espirituais dos cristãos, a assertiva de Paulo se tornaria nula. Portanto, este artigo foi escrito visando simplesmente uma análise histórica, sem adentrar no brio de algum credo religioso.

Um outro esclarecimento necessário é que chama-se de período neobabilônico o intervalo de tempo entre os reinados de Napopolassar e Belsazar, em Babilônia.

Na sua opinião, existem datas na Bíblia que estão em conflito com datas históricas? Segundo a Sociedade Torre de Vigia dos EUA, entidade dirigente das Testemunhas de Jeová, a resposta é “sim”! Segundo a Torre, a cidade de Jerusalém foi destruída no ano 607 a.C. No entanto, não há um único livro de História no mundo que forneça tal data para este acontecimento. Segundo todas as obras históricas de referência, Jerusalém foi destruída em 587 ou 586 a.C. Por causa disso, a cronologia que a Torre de Vigia apresenta em sua literatura tem uma discrepância de 20 anos em relação ao livros de História, no período anterior à primeira destruição de Jerusalém.

Estariam os especialistas em história antiga errados? Sabe-se que os cronologistas e historiadores costumam se basear na melhor evidência disponível para datar os eventos da antigüidade. Com todo esse cuidado como eles poderiam cometer um erro de 20 anos ao datarem a destruição de Jerusalém? Além disso, o mais importante é: será que a Bíblia desabona a data 587 para a destruição de Jerusalém?

 

Comparando o relato bíblico com os livros de História

Ao se falar na primeira destruição de Jerusalém é preciso lembrar que a antiga Babilônia se tornou potência dominante quando derrotou a Assíria (a potência dominante anterior). Sabe quando isso aconteceu? Sabe em que data se iniciou o domínio de Babilônia sobre as nações? Segundo os historiadores, em 612 AEC, com a queda da cidade de Nínive, a Assíria entrou em um período agonizante, e chegou ao colapso total em 609 a.C., quando o pai de Nabucodonosor derrotou Assurbalit, o último rei da Assíria. Foi em 609 que a Assíria deixou definitivamente o cenário mundial e deu lugar a Babilônia:

“Fim da Assíria. - .... Então, depois da queda de Nínive em 612, a queda de Haran em 610 e a tentativa de reconquistá-la mais tarde em 609, a Assíria deixou de existir.” – Encyclopedia Britannica, Chicago, 1964, pp. 966-67.

609. – Derrota definitiva do último rei assírio.... A ruína do império assírio permitiu que os caldeus [babilônios] estendessem o seu domínio à Síria e à Palestina.” – As Grandes Datas da Antiguidade, Portugal, 1984, Publicações Europa-América, p. 37.

O fim da Assíria (609).... O Egito, aliado da Assíria desde 616, correu em socorro de Assurbalit, mas já era muito tarde. A cidade de Harran não pôde ser reconquistada. O império neo-assírio estava vencido.” – Israel e Judá, Textos do Antigo Oriente Médio, São Paulo, Ed. Paulinas, 1985, p. 81.

“Os assírios foram definitivamente derrotados [por Babilônia] em 609 a.C. e a Assíria desapareceu da história.” – Dicionário Bíblico, John L. Mackenzie, São Paulo, 2001, Ed. Paulus, p. 90.

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Segundo esses mesmos historiadores, o domínio de Babilônia acabou em 539, data apoiada pela Torre de Vigia:

“[Os babilônios] trataram o povo de Deus de modo bem mais duro do que Seu julgamento exigia.... Quão aflitivo deve ter sido para o Deus verdadeiro ver seu povo sofrer! Mas ele se refreou de agir até o seu devido tempo. Daí.... em 539 AEC, secou e devastou Babilônia e suas defesas.” – Profecias de Isaías, Vol. II, p. 43, § 23.

Como Babilônia caiu em 539 a.C., o tempo total do domínio de Babilônia sobre as nações foi de 70 anos, o que está de acordo com o relato bíblico:

“Estas nações terão de servir ao rei de Babilônia por setenta anos”. – Jeremias 25:11.

“Somente quando os setenta anos concedidos para Babilônia acabarem, é que eu vos visitarei e cumprirei minha promessa em vosso favor por trazer-vos de volta a este lugar.” – Jeremias 29:10, Jerusalem Bible (A Tradução do Novo Mundo verte “em Babilônia”, ao invés de “para Babilônia”. Mas o texto original diz realmente “para” e não “em”. Para detalhes sobre esta diferença vide este link --> previsão: mar/2008).

609 a 539 a.C. —> resulta num domínio babilônico sobre as nações de 70 ANOS – Jeremias 25:11.

A Torre de Vigia não aceita o ano 609 como início do domínio de Babilônia. Ela acha que os 70 anos mencionados nos textos acima são de exílio dos judeus em Babilônia, e não de hegemonia babilônica. Ela aceita o ano 539 a.C., dado pelos historiadores, mas rejeita o ano 609 a.C. que esses mesmos historiadores fornecem. Mas conforme foi dito, a Bíblia não fornece datas. Sem os historiadores e suas pesquisas não é possível saber nenhuma data da Bíblia.

Interessante é que a Torre nunca mencionou a possibilidade dos 70 anos serem de domínio babilônico sobre diversas nações, ao invés de exílio dos judeus em Babilônia. Evidentemente ela não desconhece esse fato pois afirma laconicamente:

“A profecia bíblica não permite a aplicação desse período de 70 anos a qualquer outro tempo, senão ao situado entre a desolação de Judá, acompanhada pela destruição de Jerusalém, e o retorno dos exilados judaicos à sua pátria, em resultado do decreto de Ciro. Especifica claramente que os 70 anos seriam anos de devastação da terra de Judá.” – Estudo Perspicaz das Escrituras, Vol. I, p. 617, artigo “Cronologia”.

Seria melhor que ela tivesse mencionado as outras possíveis aplicações para deixar que o leitor decidisse se realmente a Bíblia não permite outra possibilidade. Segundo a Torre de Vigia as verdadeiras datas associadas à destruição de Jerusalém são as que estão no desenho abaixo:

Leia agora a descrição bíblica para o período acima (Jeremias 25:12, Nova Versão Internacional):

Quando se completarem os setenta anos, castigarei o rei de Babilônia e a sua nação”, diz Jeová.

Olhe mais uma vez o desenho acima. Segundo a Torre de Vigia, em que ano se completaram os 70 anos? Segundo ela foi em 537 AEC. Está essa data de acordo com o texto bíblico de Jeremias 25:12 ? Releia o versículo e compare com o desenho.

Jeremias foi bem claro ao dizer que a punição do rei de Babilônia só aconteceria quando acabassem os setenta anos e não antes! No entanto, no desenho defendido pela Torre a punição ocorre antes do prazo estabelecido por Deus. Para quem afirma defender fielmente a Bíblia, isso por si só já seria suficiente para perceber que o desenho acima precisa de uma revisão. No entanto, há outros fatores bem mais consistentes a serem abordados. Antes de comentá-los, porém, observe o desenho apresentado pelos historiadores para o período descrito por Jeremias 25:12:



 

Ao se comparar os dois desenhos acima, qual deles está de acordo com Jeremias 25:12? Leia o texto novamente:

“Quando se completarem os setenta anos, castigarei o rei de Babilônia e a sua nação”.

É óbvio que o segundo desenho é o correto, pois a Bíblia diz claramente que o rei de Babilônia só seria punido depois que acabassem os 70 anos e não antes.

Essa simples comparação não somente mostra que a data 609 está em harmonia com a Bíblia, mas comprova também que a Bíblia permite sim "a aplicação desse período de 70 anos" a outro período que não seja o ‘situado entre a desolação de Judá e o retorno dos exilados judaicos à sua pátria’, contrariando o desejo da Torre de Vigia de mudar a História.

Na verdade, as evidências a favor do que os historiadores defendem são muito maiores do que você talvez imagine, indo muito além da simples comparação de gráficos feitas acima, tendo por base as palavras da Bíblia.

Segundo os historiadores, Nabopolassar morreu em 605 a.C., quatro anos depois de vencer definitivamente a Assíria, e o seu filho Nabucodonosor assumiu o trono e continuou as conquistas do pai. Naquele mesmo ano derrotou o rei do Egito, o qual pouco antes matara Josias, rei de Judá. Em 587 a.C. Nabucodonosor destruiu Jerusalém, em parte porque os judeus desobedeceram o seguinte aviso:

“ ‘A nação e o reino que não o servirem, sim, a Nabucodonosor, rei de Babilônia, e aquela que não puser seu pescoço sob o jugo do rei de Babilônia, para tal nação voltarei a minha atenção com a espada, e com a fome, e com a pestilência’, é a pronunciação de Jeová, ‘até que eu tenha dado cabo deles pela sua mão’”. – Jeremias 27:8.

E quanto à data 607 a.C. para a destruição de Jerusalém? Ela é resultado UNICAMENTE do entendimento de que os 70 anos são de exílio dos judeus em Babilônia, e não de supremacia babilônica, exílio que teria durado até 537 a.C. (embora a Bíblia não relate isso. Veja 2 Crônicas 36:22). Recuando-se 70 anos a partir do ano 537, chega-se à data 607 a.C.. Mas note os problemas insolúveis que tal entendimento ocasiona.

A quem as nações serviriam 70 anos (inclusive Judá)? “Ao rei de Babilônia”. (Jer. 25:11) Ora, se os 70 anos terminassem em 537, significaria que desses 70 anos, 68 seriam de servidão ao rei de Babilônia e 2 anos de servidão ao rei persa Ciro, contradizendo a declaração bíblica de Jeremias 25:11 (reveja o primeiro desenho mostrado).

Outro fato grave: não existe uma fonte arqueológica sequer que indique a destruição de Jerusalém em 607 a.C.. Por outro lado, foram desenterradas MILHARES de tabuinhas cuneiformes da antiga Babilônia que marcam a destruição de Jerusalém em 587/586 a.C.. Por isso a data 607 AEC não existe nos livros de História, e segundo tais fontes o exílio dos judeus durou cerca de 50 anos, e não 70. Durou de 586/7 a 538/37 AEC.

Na verdade, a Torre de Vigia não foi a primeira a se confundir neste assunto do exílio dos judeus. Certa vez , o historiador Flávio Josefo, do primeiro século, disse que o exílio em Babilônia tinha durado setenta anos (Antiguidades Judaicas X, 7, 3; X, 9, 7; XI, 1, 1; XX, 10, 2; e em Contra Apião, I, 19). No entanto, em uma idade mais avançada, Josefo corrigiu várias informações que ele apresentara anteriormente. E uma delas foi justamente a duração do exílio dos judeus. Abonando a cronologia de Beroso, ele disse:

"Esta declaração [de Beroso] tanto é correta como está em harmonia com nossos livros [isto é, as Escrituras Sagradas]. Pois nestes está registrado que Nabucodonosor, no décimo oitavo ano de seu reinado, devastou o nosso templo, que por cinqüenta anos este deixou de existir, que no segundo ano de Ciro as fundações foram lançadas, e por fim que no segundo ano do reinado de Dario foi terminado." - Contra Apião I, 21, em Obras Completas de Josefo, traduzido por William Whiston, em inglês - Grand Rapids: Publicações Kregel, 1978; colchetes acrescentados.

Perceba que mover a destruição de Jerusalém de 587 para 607 (para forçar uma exílio de 70 anos), aumenta o domínio de Babilônia sobre as nações de 70 para 90 anos, descaracterizando completamente o texto de Jeremias 25:11 que afirma claramente: “E estas nações terão de servir ao rei de Babilônia por setenta anos.” E assim ocorreu, nenhum ano a mais, nenhum ano a menos.

O período neobabilônico segundo a cronologia de Beroso

Beroso foi um sacerdote caldeu que assentou por escrito a duração dos reinados de todos os governantes neobabilônicos, desde Nabopolassar até Nabonido. Esta mesma cronologia foi adotada pelo astrônomo grego Ptolomeu, que editou a lista que veio ser conhecida por "Cânon de Ptolomeu". De acordo com Beroso e Ptolomeu, quais foram os reis caldeus que governaram no período neobabilônico? Foram: (1) Nabopolassar, (2) Nabucodonosor, (3) Evil-Merodaque, (4) Neriglissar, (5) Labashi-Marduque, (6) Nabonido e (7) Belsazar, sendo que essa dinastia findou em 539 a.C. – Informação extraída da Despertai! de 8 de setembro de 1980, p. 28, § 8.

Quanto tempo durou cada reinado? A Torre de Vigia responde: “Segundo este Cânon, os cinco reis que regeram neste período foram Nabopolassar (21 anos), Nabucodonosor (43 anos), Evil-Merodaque (2 anos), Neriglissar (4 anos), e Nabonide (17 anos).” (O rei Labashi-Marduque reinou apenas 9 meses). – Despertai!, 8/11/1972, p. 27, § 8.

Pois bem, de posse das informações acima é possível montar uma tabela na qual se determina quando cada governante começou a reinar. Basta somar para trás quanto cada governante reinou a partir do ano 539 a.C. Por exemplo, Nabonido reinou 17 anos e o seu último ano foi 539 a.C.. Logo, o seu primeiro ano foi em 555 a.C. (539 + 16 anos), e assim por diante. Pela soma de todos os reinados, veja em que ano Nabucodonosor iniciou seu governo (anos a.C.):

Observação: Para calcular a duração de um reinado, aplique a fórmula: ano maior ano menor + 1

Claramente Nabucodonosor iniciou o seu reinado em 604 a.C. Conforme certo versículo da Bíblia, ele destruiu Jerusalém no seu 18º ano de reinado. Se ele começou a reinar em 604 a.C., o seu 18º ano foi 587 a.C., e não 607 a.C. Se o ano 607 for considerado o seu 18º ano, o seu 1º ano será 625. Se isso for aceito note o que acontece com a tabela acima:

Lembre-se que as próprias publicações da Torre de Vigia fornecem os dados que geram as tabelas acima, dados estes que realmente os especialistas divulgam. Obviamente, para tentar salvar sua cronologia, pelo menos na aparência, a Torre de Vigia ensina às Testemunhas de Jeová que os números nessa lista de reis não são definitivos e que ela deve estar errada em algum ponto. Para saber se isto é possível ou não, siga adiante na leitura deste artigo.

A brecha de 20 anos que existe na tabela defendida pela Torre é irreparável, visto que o tempo de reinado de cada governante não pode ser mudado, por motivos que vão ser considerados mais à frente. Deslocar a destruição de Jerusalém 20 anos para trás causa uma ruptura no período historicamente estabelecido, deixando um intervalo completamente descoberto, conforme indicado nos desenhos a seguir:
 

Até hoje a Torre de Vigia nunca explicou o paradoxo acima, e nem poderá fazê-lo, pois ele não tem solução, a não ser aceitar o mais plausível e confiável. Mas ela não quer fazer isso, pois se fizesse demoliria completamente um dogma dela que depende da data 607 a.C. Segundo a Torre de Vigia, em 1914 começaram os "últimos dias" marcados pela profecia bíblica, os quais prenunciam o iminente “fim do mundo”.*

* Este ano seria o momento final de um período profetizado de 2.520 anos, o qual começou no ano em que Jerusalém foi destruída pelos babilônios. Aceitar a data 587 moveria o fim desse "período profético" para 1934, contradizendo assim o ensino das Testemunhas de Jeová de que o ano de 1914 marca o "retorno invisível" de Cristo e o início de seu reinado. Segundo dizem, uma das primeiras "providências" de Cristo como rei foi inspecionar as religiões cristãs no ano de 1918. Após essa "inspeção", Jesus rejeitou todas as denominações cristãs do planeta, exceto a Torre de Vigia, que de 1919 em diante "passou a ter" o privilégio de ser a única religião verdadeira de Deus na Terra, através da qual Deus ensina as pessoas. Portanto, rejeitar a data 607 significaria admitir que todo esse ensino não passou de mera especulação e que as Testemunhas de Jeová acreditaram numa mentira. Para mais detalhes leia depois este link.

Por estar consciente da lacuna que sua cronologia ocasiona, a Torre de Vigia se apóia na teoria de que as cifras acima podem ser incompletas e que novas descobertas arqueológicas podem mudar os períodos em questão. Por exemplo, note algumas declarações que ela faz neste sentido:

Citação 1

"Pode-se notar que a frase 'décimo sétimo ano' não consta na tabuinha [Crônica de Nabonido], estando danificada esta parte do texto. Esta frase é inserida pelos tradutores, porque eles acreditam que o 17.° ano de reinado de Nabonido foi seu último. Assim, presumem que a queda da cidade de Babilônia se deu naquele ano do seu reinado e que, se a tabuinha não estivesse danificada, essas palavras apareceriam no espaço agora danificado. Mesmo que o reinado de Nabonido tenha durado mais do que em geral se supõe, isto não mudaria a data aceita de 539 AEC como ano da queda de Babilônia, porque há outras fontes que indicam este ano. Este fator, porém, diminui até certo ponto o valor da Crônica de Nabonido." – Estudo Perspicaz das Escrituras, volume 3, p. 52, verbete “Nabonido”, colchetes e sublinhados acrescentados.

Nota-se que a Torre de Vigia considera a possibilidade do reinado de Nabonido ter durado mais de 17 anos. Sem dúvida, isto poderia ajudá-la a reparar a brecha de 20 anos de sua cronologia.

Citação 2

"Do ponto de vista secular, tais tipos de evidência talvez pareçam confirmar a cronologia neobabilônica que fixa o 18.° ano de Nabucodonosor (e a destruição de Jerusalém) em 587/6 A.E.C. No entanto, nenhum historiador pode negar a possibilidade de que o atual quadro da história babilônica pode ser enganoso ou errado. Por exemplo, sabe-se que os antigos sacerdotes e reis às vezes alteravam os registros para os seus próprios fins. Ou mesmo quando a evidência descoberta é exata, poderá ser interpretada mal pelos eruditos modernos ou ser incompleta, a ponto de que matéria ainda a ser descoberta poderá alterar drasticamente a cronologia do período em questão." - Livro Venha o Teu Reino, p. 187, publicado pela Torre de Vigia.

A Torre de Vigia já começa o parágrafo desacreditando as fontes seculares, como se elas contradissessem a Bíblia nesta questão. Esboça a teoria de que a tabela de reis neobabilônicos está incompleta por causa do material arqueológico "ainda a ser descoberto". Depois do trecho acima, a Torre de Vigia cita as seguintes palavras do Dr. Edward F. Campbell Jr.:

"Nem se precisa dizer que estas listas são provisórias. Quanto mais se estuda a complexidade dos problemas cronológicos no antigo Oriente Próximo, tanto menos se está inclinado a pensar numa apresentação como sendo definitiva. Por este motivo, o termo circa [cerca de] poderia ser usado ainda mais liberalmente do que é."

Mas o que a Torre de Vigia "esqueceu" de mencionar é que a história do Oriente Próximo, sobre a qual Campbell estava falando, compreende um período de quase 2.000 anos. (Veja neste site a cronologia completa de Babilônia) e inclui as cronologias do Egito, Palestina, Síria, Ásia Menor e Assíria. Certamente é difícil determinar com segurança várias datas deste longo intervalo e de todas estas nações. No entanto, o período neobabilônico só durou um pouco mais de 70 anos e existe um conjunto super abundante de achados arqueológicos que confirmam as datas desta parte da história de Babilônia. Além do mais, conforme o próprio Campbell disse, os escribas neobabilônicos não tinham o costume de alterar os registros com objetivos particulares, como acontecia em outras nações. Portanto, era isto o que Campbell tinha em mente quando fez seu comentário! Quando ele soube que foi citado fora de contexto pela Torre de Vigia ele ficou muito indignado, pois ele nunca teve dúvida de que as datas do período neobabilônico estão todas corretas. Leia depois as palavras dele nesse artigo.

Citação 3

“Certamente não é sábio insistir em que as cifras tradicionais para os reinados dos reis neobabilônicos sejam aceitas como definitivas.” – Estudo Perspicaz das Escrituras, volume 1, p. 608, verbete “Cronologia”.

A citação acima resume bem o que a Torre de Vigia quer que as Testemunhas de Jeová pensem sobre a era neobabilônica, conforme é descrita pelos historiadores. Mas a Torre não revela em sua totalidade o real motivo porque muitos continuam a "insistir" que os períodos apresentados por Beroso e Ptolomeu são os corretos e definitivos. Só diz que quem aceita a lista deles não é sábio...

Na verdade, o contrário é que é verdadeiro. Não é sábio rejeitar as cifras tradicionais, pois as evidências a favor delas são muito abundantes. A quantidade de matéria existente em favor das datas universalmente aceitas da era neobabilônica preencheria literalmente um livro de centenas de páginas. O que está aqui neste artigo é apenas um "resumo do resumo" e não uma abordagem completa de tudo que existe a favor do ano 587. Dentro desse arcabouço arqueológico, podem-se destacar as evidências prosopográficas*, que são aquelas em que eventos do cotidiando neobabilônico fornecem informações adicionais sobre a duração dos reinados e os elos de ligação entre eles. Estes eventos eram registrados diariamente em tabuinhas cuneiformes. Por exemplo, havia uma importante família em Babilônia chamada Egibe que possuía um próspero empreendimento comercial. O assiriologista Bruno Meissner disse o seguinte sobre essa firma:

"Da empresa Filhos de Egibi nós possuímos tão grande abundância de documentos, que podemos rastrear quase todas as transações comerciais e experiências pessoais de seus dirigentes, desde a época de Nabucodonosor até a época de Dario I." - Babilônia e Assíria, Bruno Meissner, Vol. II (Heidelberg, 1925), pág. 331. Traduzido do alemão.

* A prosopografia (do grego prósopon, que significa "rosto" ou "pessoa") é “o estudo das biografias, especialmente de indivíduos unidos por relações familiares, econômicas, sociais, ou políticas.” - Novo Dicionário Mundial de Webster, 3ª edição acadêmica, eds. V. Neufeldt & D. B. Guralnik (Nova Iorque: Novos Dicionários Mundiais de Webster, 1988), pág. 1080, em inglês.

Para entender como tal exame prosopográfico é de extrema utilidade, basta dizer que praticamente nenhuma transação comercial era feita sem que se mencionasse o ano do rei, além de identificá-lo por nome. Quando o rei morria automaticamente a contabilidade comercial dos babilônios passava a mencionar o novo governante em seus lançamentos. Portanto, é possível saber a duração dos reinados babilônicos apenas por se rastrear e estudar a documentação comercial daquela época. E o quadro cronológico obtido por este vasto material torna impossível a inclusão de novos reis no período neobabilônico ou o "esticamento" da duração de seus reinados. No caso da empresa dos Egibe, os documentos cuneiformes dela fornecem um intervalo de oitenta e um anos de atividades, que vão do 3º ano de Nabucodonosor até o 1º ano de Dario Histaspes, conforme mostrado na tabela abaixo:

Como era de se esperar, a tabela acima está em total harmonia com o Cânon de Ptolomeu e com a Lista de Reis de Beroso. Recuando-se oitenta e um anos para trás desde o primeiro ano de Dario I (521/20 AEC) chega-se ao ano 602/601 AEC. Este é o terceiro ano de Nabucodonosor de acordo com os registros comerciais da empresa babilônica Egibe & Filhos. Sendo assim, basta somar três anos para descobrir qual foi o primeiro ano de Nabucodonosor. O resultado é 605/604 AEC, data que também pode ser obtida de diversas outras maneiras independentes.

Portanto, somente as tabuinhas comerciais da família Egibe são suficientes para determinar o inteiro período neobabilônico sem nenhuma margem de erro. Se outros documentos comerciais ou religiosos dos cidadãos neobabilônicos forem estudados, eles também confirmarão que a lista de reis de Beroso e o Cânon de Ptolomeu estão corretos. E isto é assim mui provavelmente porque eles também tiveram acesso aos mesmíssimos documentos que os especialistas estudam hoje em dia. Beroso e Ptolomeu não fizeram suas listas baseando-se 'simplesmente numa informação histórica que era a aceita no período selêucida', como alega a Torre de Vigia. - Livro Venha o Teu Reino, p. 187.

Observe que os documentos comerciais da firma dos Egibe são todos originais, e não cópias. É bom que se destaque esse pormenor, uma vez que a Torre de Vigia costuma mencionar que alguns documentos que retratam o período neobabilônico são cópias. Ela faz isto para tentar desacreditar o conteúdo deles.

Em suma, pelo exposto até aqui, percebe-se que a cronologia neobabilônica é umas das mais seguras da Antigüidade, tanto pela quantidade de material arqueológico disponível, como pela precisão e qualidade dessas fontes, recebendo especial destaque os vários textos astronômicos que registram a posição dos planetas em certas constelações, e os eclipses que aconteciam ao longo dos anos, sendo que esses registros indicavam os reis de cada período astronômico mencionado. Todos esses fatores em conjunto permitem traçar um histórico completo das sucessões dos governantes neobabilônicos.

E o mais importante: independente de existir todo esse farto material em apoio à data 587, lembre-se que tal data não é uma "cronologia secular" que discorda da "cronologia bíblica", como a Torre de Vigia costuma dizer. Isto simplesmente não é verdade, como foi bem demonstrado aqui! A Testemunha de Jeová que não acredita na data 587 apenas porque a Torre diz que ela contradiz a Bíblia, não tem razão nenhuma para continuar com essa opinião depois que descobre as informações contidas neste artigo e em outros relacionados, uma vez que foi demonstrado cabalmente que é a cronologia da Torre de Vigia que está contradizendo a Bíblia e não a cronologia secular, que foi historicamente estabelecida de maneira segura e confiável.

Conclusão

De forma resumida, essas são as fontes que possibilitam datar a destruição de Jerusalém em 587/586 a.C.:

1. Crônicas, registros históricos, e inscrições reais do período neobabilônico, começando com Nabopolasar e terminando com os reinados de Nabonido e Belsazar, período que vai de 626 até 539 a.C.:

    1. Diversas crônicas babilônicas tais como a crônica de Nabonido
    2. Nabonido N.º 18
    3. A estela de Hilá (Nabonido N.º 8)
    4. A estela de Adda-Gupp (Nabonido H1,B)
    5. Lista real de Beroso
    6. Cânon de Ptolomeu

2. Documentos Comerciais e Administrativos: tabuinhas cuneiformes que são datadas para cada ano do período neobabilônico tal como estabelecido por Beroso e Ptolomeu; nenhuma tabuinha está datada de forma imprecisa. Cerca de 5.000 delas já foram publicadas e faltam umas 50.000. Estes são documentos contemporâneos do período neobabilônico, e não são cópias.


Tabuinha Cuneiforme

3. Diários Astronômicos:

3.1. VAT 4956 fixa o 37º ano de Nabucodonosor em 568 a.C. por um jogo único de observações astronômicas, que não podem ser confundidas com nenhum outro ano. Estabelece o seu ano de ascensão em 605 a.C.
3.2. BM 32312 mais a Crônica de Aquito colocam o 16º ano de Samas-sum-iuquim (um rei babilônico anterior ao período neobabilônico) em 652/1 a.C.. Combinando-se essa tabuinha com os documentos comerciais, o cânon de Ptolomeu, a crônica de Aquito e a lista de Reis de Uruque, obtém-se o período 605/4-562/1 a.C. como sendo a duração do reinado de Nabucodonosor, com seu 18º ano em 587/6 a.C.

Para uma consideração mais detalhada das evidências astronômicas, leia o artigo Como se Determinam as Antigas Datas da História Bíblica?

4. Textos Saros (tabuinhas sobre eclipses lunares): quatro textos independentes fornecem datas absolutas dentro do período neobabilônico. Por eles, o 18º ano de Nabucodonosor é fixado em 587/6 a.C.

5. Sincronismo com a cronologia egípcia independente e contemporânea ao período neobabilônico:

5.1. Pelo cômputo egípcio, Josias morreu durante o reinado do faraó Neco, que começou em 610 AEC..
5.2. Alguns Judeus fugiram para o Egito, que estava sob o domínio do faraó Hofra (Apriés), logo depois da destruição de Jerusalém. Visto que, segundo a cronologia egípcia, Hofra começou a reinar em 589 a.C., Jerusalém não poderia ter sido destruída em 607 a.C., dezoito anos antes.
5.3. Um texto cuneiforme fragmentado menciona uma batalha travada por Nabucodonosor no seu 37º ano contra o faraó Amasis, que começou a reinar em 570 a.C. A Sociedade Torre de Vigia data a morte de Nabucodonosor em 582 a.C.. Se ele tivesse morrido em 582, como ele poderia estar em batalha contra o faraó Amasis em 570 a.C., doze anos depois?

Conforme a Torre de Vigia já comentou, houve críticos da Bíblia que não criam na existência de Belsazar (último rei de Babilônia), porque só a Bíblia o mencionava. Um único achado arqueológico, porém, a crônica de Nabonido, os forçou a mudar de opinião (depois foi encontrado um cilindro com a mesma informação). O que dizer de um assunto que ao invés de ter somente dois achados arqueológicos para prová-lo, tem milhares? Duvidar dessas fontes é fazer o mesmo que os críticos anti-Belsazar faziam, ou pior.

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