A mudança na distribuição de literaturas
Por: Raymond Franz
Fonte: O Sentinela
Em 25 de fevereiro de
1990, foi anunciado nos Estados Unidos que à partir do dia 1 de março
de 1990, a literatura da Watchtower seria distribuída gratuitamente -
à base de donativos sem se pedir nenhum tipo de contribuição. Nos
Salões do Reino através de todo o país foi lido às Testemunhas
informações da organização, que apresentavam esta mudança como
motivada pelo interesse em "simplificar enormemente nosso
trabalho de educação bíblica e separar-nos daqueles que
comercializam a religião". Foi apresentado como algo que
tornaria a literatura mais acessível a todas as pessoas. Por esta razão,
toda a mudança no procedimento foi acobertada como algo de caráter
beneficente e desinteressado.
O que não foi dito
é que, muito tempo antes que se fizesse este anúncio, a Watchtower
Society sabia que estava em julgamento nos tribunais dos Estados
Unidos o direito de um estado exigir impostos sobre a venda de
literatura religiosa por ministros religiosos. Isto surgiu
relacionado com a imposição por parte do estado da Califórnia de um
imposto de 16% sobra a literatura distribuida pelos ministros de Jimmy
Swaggart, um dos mais proeminentes tele-evangelizadores americanos. A
Watchtower Society, junto com o Concílio Nacional das Igrejas de
Cristo, a Sociedade Californiana para Consciência Krishna, e outros
grupos religiosos, entrou com uma ação amicus curiae (amigo
do tribunal) neste caso, solicitando ao tribunal que declarasse
inconstitucional a cobrança de imposto por parte de um estado sobre a
venda de literatura religiosa por uma organização religiosa.
Entretanto, em 17 de janeiro de 1991, o Supremo Tribunal dos Estados
Unidos pronunciou-se a favor do direito de um estado exigir tal
imposto. No mês seguinte, fevereiro de 1991, a Watchtower Society
publicou o anúncio da mudança para o arranjo de distribuição de
"literatura gratuita". Esse
anúncio não continha nem uma única palavra sobre a questão dos
impostos.
Às Testemunhas,
transmitiu-se a idéia de que a decisão da organização havia sido
tomada puramente com base em outros motivos, beneficentes e altruístas.
Isto é claramente uma manifestação de cinismo. Um artigo no The
Atlanta Journal & Constitution de 3 de março de 1990, baseado
numa entrevista com o advogado da Watchtower, Philip Brumley afirmou:
Segundo palavras
do Sr. Brumley, algumas decisões do Supremo Tribunal, incluindo uma
recente decisão à favor do direito da Califórnia em fixar impostos
sobre a literatura e as fitas vendidas pelos ministros de Jimmy
Swaggart, convenceram os líderes das Testemunhas a não sugerir
contribuições.
Se portanto, o fato
motivador fosse tornar mais acessível para as pessoas a mensagem
contida nas literaturas da Watchtower, por que limita-se atualmente
este "arranjo de literatura gratuita" aos Estados Unidos,
Canadá, Alemanha, Itália e outros países da Europa, países com
economias notoriamente fortes? Por que não se fez em todo o mundo? Se
era aconselhável uma introdução gradual, por que não começou por
alguns dos países mais pobres do mundo? Por que não foi implementado
em primeiro lugar nos países do chamado Terceiro Mundo, onde a
pobreza é extensiva? Se o novo arranjo é para mostrar que estão
separados "daqueles que comercializam com a religião", por
que continuam com o antigo arranjo nestes outros países?
A realidade é que a
aplicação da palavra "grátis" é uma grande inverdade
quando se compara com a prática.
Anteriormente, as
Testemunhas compravam sua literatura no Salão do Reino, e quando a
"colocavam" nas mãos das pessoas, pediam "contribuições"
específicas, ficando com a quantidade recebida para compensar o que
haviam gastado inicialmente para obter a literatura. Agora, eles
conseguem a literatura no Salão, sem pagar diretamente por ela, porém
se coloca uma "caixa de contribuições" perto do balcão de
literaturas, e existe um sentimento de pressão para contribuir por
todas as literaturas recebidas. Logo, ao colocar a literatura ao público,
se lhes aconselha mencionar à pessoa que fica com a literatura que
aceita-se qualquer contribuição dela, sem porém especificar nenhuma
quantia. Se recebe alguma doação, a Testemunha sabe que não se deve
ficar com o valor (que cobriria o desembolso já feito pela literatura
na caixa de contribuição), mas que deve entregar para a Watchtower
Society em forma de nova contribuição. Deste modo, é possível que
em muitos casos a organização receba não somente o que recebia
anteriormente, mas sim o dobro do que recebia antes.
Agora quando se
anuncia alguma publicação nas revistas da Watchtower não se
menciona a contribuição correspondente. Entretanto, se o leitor
escreve pedindo a publicação, e não anexa uma contribuição com o
pedido, a prática no escritório central é encarregar uma Testemunha
da região de visitar a pessoa, levando a publicação solicitada, o
que permite que a Testemunha sugira que a pessoa contribua por ela.
Da mesma forma, a
organização tem adotado o arranjo de oferecer alimentos
"gratuitos" nas assembléias para os assistentes, este também
teve um precedente. Recordo que, quando formava parte do Corpo
Governante, o governo da Alemanha aplicou um pesado imposto à filial
local da Watchtower, alegando que as operações nos serviços de
alimentação das assembléias eram claramente operações lucrativas.
As Testemunhas alemãs tiveram que disponibilizar o equivalente a mais
de um milhão de dólares para pagar o imposto. Nos EUA, todos os
encarregados da administração de assembléias (chamados
superintendentes de assembléias de distrito), tem recebido há muito
tempo instruções para que a operação do serviço de alimentação
cobrisse todos os gastos da assembléia. As Testemunhas talvez
pensassem que o dinheiro que colocavam nas numerosas caixas de
contribuição nos recintos das assembléias era usado para cobrir
estes gastos, porém os superintendentes de assembléias recebiam
ordens para que todas estas contribuições fossem enviadas
diretamente para a Watchtower Society, e não devia-se usá-las para
cobrir os gastos com a assembléia.
Pergunta-se quanto
tempo tardará a organização em estender este arranjo aos países
mais pobres do mundo. Talvez se dão conta de que, ao contrário dos
resultados obtidos nos países economicamente fortes nos quais este
arranjo está agora em vigor, o retorno material seria reduzido ao pô-lo
em prática nos países mais pobres, já que não só o público
nestes países estaria menos disposto a fazer contribuições pelas
literaturas que aceitasse, mas também que muitas Testemunhas
veriam-se impossibilitadas de suportar o esforço financeiro de dar
literaturas às pessoas sem poder cobrir pelo menos seus próprios
gastos.
Deste modo, as
palavras publicadas pelos líderes da organização como justificativa
do seu novo arranjo continuam soando mentirosas, e sua omissão em
manifestar francamente aos membros os fatores que existem por trás da
mudança - de fato escondendo a verdadeira razão - persiste como evidência
notável de cinismo, como manifestação de um certo menosprezo pela
sua inteligência. Isso dificilmente se pode considerar como amor ao
próximo, expressado aos outros da mesma forma que alguém gostaria de
ver expressado a si mesmo.
Trecho do livro
"In Search of Christian Freedom"
*Nota: Raymond
Franz, ex-membro do Corpo Governante das Testemunhas de Jeová, já
tem seu primeiro livro, "Crise de Consciência", editado em
português. Informações no site:
http://www.agevir.com.br/testemunha